Para aonde ir? Para que respirar? Para que lutar? Para quê? O vazio era meu novo companheiro. Como Ana pôde fazer isso comigo? Destruir meu coração sem piedade?
Como um amor tão avassalador pôde virar indiferença? Ana, o que você fez com nossos planos? Você se esqueceu das juras de amor realizadas com o testemunho da lua?
Uma pedra no caminho recebeu meu desgosto ao ser chutada. Rolou para dentro do matagal sendo separada de suas outras irmãs. Os faróis de um carro me cegaram por instantes. Tossi por causa da poeira levantada da estrada de terra.
O que eu fazia aqui no meio do nada? Depois que tudo aconteceu, eu apenas corri. Deixei que meus pés me guiassem para o mais longe possível daquela cena.
Um suspiro choroso escapou dos meus lábios. Lembrar daquilo fazia cada parte minha estremecer. E nada mais de estrada, poeira, ou faróis, a única coisa que meu cérebro conseguia focar era a lembrança do rosto de Ana.
Não o rosto que amei por tantos anos, e sim o rosto de alguém que não parecia mais a minha Ana. Alguém que não compartilhava mais uma vida comigo e que, provavelmente, nunca mais compartilharia.
Nossa história era para ser contada em magníficos livros de romances. Não apenas meu coração sabia disso, todos a nossa volta concordavam. Ana e Anderson, o casal perfeito, que dava inveja a qualquer outro.
Nós éramos como um só. Havia tanto amor em apenas um olhar compartilhado, então os olhos de Ana simplesmente já não refletiam os meus.
O que acontecera com aquela paixão descontrolada que nos agarrou quando ainda éramos colegas de escola? Ela foi meu primeiro amor e eu o dela. Juntos descobrimos os sabores dos beijos, o calor das carícias, os prazeres de nossos corpos.
Éramos tão unidos que não precisávamos de mais ninguém. Quando estávamos tristes, era um ao outro que procurávamos. Se as novidades fossem felizes, eram nos mesmos braços que pulávamos empolgados. Nunca precisei de mais ninguém. E pensei que para ela fosse o mesmo.
Ao passarmos no vestibular para o mesmo curso, fizemos incontáveis planos para o nosso futuro. Então, depois de um semestre ela jogou tudo fora!
De repente, minha presença não bastava. Minha fala a incomodava e nossos beijos escassearam. Sem explicação, Ana pediu transferência para outra faculdade, consequentemente, outra cidade.
Tentei entender. Tentei dar espaço como ela pediu. Não liguei mais diariamente, mesmo que o impedimento de ouvir sua voz me brindasse com insônia. Fiz exatamente o que ela pediu, porque no fim eu sabia que uma história de primeiro amor como a nossa nunca chegaria ao fim.
Mas então tudo desmoronou. Cobri o rosto com as mãos, como se isso pudesse afastar a última imagem de Ana de minha mente. A respiração me faltou, minhas pernas perderam a força.
Cambaleante, como um bêbado, me arrastei pela estrada, deixei o corpo descansar nas pedras úmidas, grandes e cinzas de uma ponte antiga para pedestres com destino a uma comunidade do interior rural da cidade.
Sentado naquelas pedras frias, encolhi os joelhos contra meu peito. Tentei inspirar, o ar me faltava. A dor em meu peito só aumentou.
Por que fez isso comigo, Ana?
Gritei para a lua parcialmente coberta pela névoa. A escuridão se intensificava. A estrada em que meus pés tocaram anteriormente já não era visível, e nem faróis esporádicos se aventuravam mais.
O olhar de indiferença de Ana, de quando nos cruzamos na rua, voltou a assombrar minha mente.
Nosso encontro não foi combinado. Ela estava na cidade há uma semana para visitar os pais, embora eu não soubesse disso naquele momento.
Ao avistá-la na rua na companhia da mãe, corri até ela. Pensei que ela estava ali para me fazer uma surpresa. Que talvez houvesse desistido das coisas sem sentido do último mês e que nossa perfeita história de amor seguiria o seu destino.
Suas mãos me afastaram como se eu fosse um pedinte. E a voz doce soltou o verbo ligeiro. Palavras sobre uma nova vida, sobre novos sonhos e coisas que eu não entendia.
Então as palavras se tornaram uma lança e atingiram meu coração. “Eu me apaixonei por outro”, ela comunicou. E quando me mantive estático, em choque, Ana completou: “Siga sua vida, Anderson. E não me procure mais”.
Seguir minha vida? Que vida? Você era minha vida!, sussurrei para a escuridão.

Prendi o ar e estiquei os pés para o nada branco, me entregaria ao fim.
— Águas profundas não são a resposta para nada. — Uma voz suave ecoou ao meu lado esquerdo.
O movimento impulsivo foi paralisado, meus dedos agarraram a borda da ponte com força. O olhar procurou a dona da voz com uma lentidão amedrontada. O coração disparado.
Meu olhar alcançou uma jovem com o rosto parcialmente encoberto pelo capuz do casaco, não muito mais velha do que eu, em pé ao meu lado com os braços apoiados na borda também contemplando a água.
De onde essa criatura veio? Observei ao redor. Nada de casas, carros, bicicletas ou qualquer indício de que havia algo nas redondezas.
Fechei os olhos ardidos por causa das lágrimas ácidas já derramadas, na dúvida se tal garota era real.
Seria o chamado da morte? Um fantasma?
— Não faça isso! — A voz feminina suplicou baixinho quando seus dedos gelados envolveram meu pulso, com mais força do que eu poderia imaginar, para então voltarem a se esconder nos bolsos do seu casaco.
O choque afastara meu impulso autodestruidor. Neste momento, aquela presença inusitada ganhara minha atenção. Um medo me dominou. E se ela fosse um ser sobrenatural à espera de minha fraqueza, para roubar minha alma? Será que histórias de vampiros eram verdadeiras?
Lentamente voltei para a segurança da ponte, mantive meu corpo afastado do da garota. Ponderava uma rota de fuga enquanto seus olhos encaravam os meus com intensidade. Era como se ela pudesse ler meu sofrimento.
— O que quer que tenha acontecido, você deve saber que as coisas sempre mudam. — Ela soltou ao vento sem virar seu rosto em minha direção.
— Como pode saber disso? — desafiei. Não aceitaria nenhum “contrato de sangue” e nem venderia minha alma.
Por que me importo? De repente percebi que há um minuto eu pretendia lançar minha vida ao nada. Não era o mesmo que desistir de minha alma?
— Só sei. — Então seus olhos prenderam-se aos meus. — Toda vida é preciosa.
— Nem toda. Algumas trazem apenas sofrimento. — Desviei o olhar e me reconectei com o buraco sangrento que Ana me infligira e que antes fora meu coração.
— Me dê uma chance de provar o contrário.
— Por que se importa? — resmunguei com vergonha ao dar um passo para longe dela.
— Você precisa de uma amiga — disse sem responder minha pergunta. Ela estendeu a mão em minha direção. — Me deixe ser essa amiga.
— Você nem me conhece! — Essa conversa era alucinação? E se eu já tivesse caído?
— Mas quero conhecer. — Um sorriso tímido, forçando simpatia se formou no rosto dela. — Você ia desistir de tudo. O que tem a perder ao me dar uma chance.
— Você quer me enganar? — Sobre o quê e como eu não sabia, mas tinha algo muito estranho nessa história toda. Ela negou veementemente com um aceno, enquanto seus olhos se mantinham fixo em mim com tristeza. — Tudo bem.
Aceitei sua mão e a acompanhei em silêncio pela estrada de terra para longe da ponte.
Meu coração já estava semimorto mesmo, Ana arrancara uma parte e eu sabia que nunca mais seria possível me livrar dessa dor. Mesmo assim me deixei ser levado pela garota misteriosa, pelo simples fato de que seria impossível abdicar de mim enquanto ela estivesse ali me olhando. E depois, por que não poderia morrer em paz enquanto não descobrisse quem era e como essa garota me encontrou ali.
Próximo capítulo (em breve)
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Beijinhos, S. G. Conzatti
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